segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
ao maquinista menor, teimosa homenagem
A partir de janeiro, postaremos no blog uma série de textos de Valter que se encontram dispersos pelo mundo (em revistas, livros, jornais, sites etc.). A postagem cumpre uma curiosa missão: como ele nunca os postou diretamente no blog, indicando apenas links de alguns deles, um tanto tardiamente o faremos por teimosia; não apenas uma homenagem, mas uma celebração das amizades que ele arranjou no pensamento, na vida. Reencontrar Valter em sua escrita, em seu estilo, texto-pulsante, força maior. Nossa graça – dádiva e tesão – para manter o USINA funcionando, produzindo aquilo que o maquinista menor sempre favoreceu com maestria: bons encontros.
Antecipando, segue um poema daquela "vida bonita", entre os papéis...
Oi me diga quem és
Acho que sou saudades
Vim de não sei onde
Talvez de cartas e dizeres
Ruas e olhares
Distâncias próximas
Vida breve muito longa
Um estar-se perto e não tocar
Um estar-se longe e não falar
Mas agora moro aqui
Dentro do coração
Às vezes dormente
Ou como um furacão
É quando a lua me acorda
Lua, de céu e estrelas
Às vezes acordo com palavras
Outras vezes na falta de dizeres
Ainda não sei quem sou
Em que céu estou
Para que estrela olhar
Mas alguém me chamou e me saudou de
Saudades
Valter Rodrigues
***
usineir@s e usinad@s, até janeiro!
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Valter A. Rodrigues
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Ressentimento, por Amauri Ferreira
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
Clínica, indeterminação e biopoder, por Auterives Maciel
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
Ressentimento: veneno do espírito, por Spartaco Vizzoto
terça-feira, 3 de agosto de 2010
Alegria de Segundo Plano ou Alegria Acontecimento, por Bruno Vasconcelos
O presente trabalho é uma versão modificada do texto base utilizado para apresentação da dissertação de mestrado intitulada Cartografias da Alegria na Clínica e na Literatura, defendida em maio de 2005, na PUC de São Paulo. Nele percorro alguns dos problemas que desembocaram na escrita da dissertação. Casos clínicos e contos literários deram ensejo a uma problematização da clínica enquanto espaço de metamorfose das sensações em vibrações intensivas, enquanto espaço aberto ao tempo, enquanto espaço expressivo – tomando a alegria como potência, e por fim, enquanto espaço e duração de dor e sofrimento. No plano teórico, os pensamentos de Nietzsche, Espinosa, Deleuze e Blanchot, alimentaram a escrita e forçaram o autor a buscar pontos de conexões e transversalidades, linhas de fuga e devires, no esforço de construir um texto que desse conta da alegria. Tomar a clínica como produção de subjetividades em meio ao encontro com o intolerável e o trágico, levando o pensamento a paragens antes desconhecidas. Este trabalho sinaliza a existência de um modo subterrâneo percorrendo a produção da escrita, no encontro intensivo com aquilo que não sabemos nomear.
Palavras-chave: alegria; clínica; literatura.
Se, antes de tratar nosso tema detidamente, disséssemos, gracejando, que todos os seres desejam contemplar e voltam-se a esse fim, tanto os racionais quanto os irracionais, e ainda as plantas e a terra que as engendra, e que todos estes seres chegam a esse fim enquanto são capazes, de acordo com sua natureza, mas que eles contemplam cada um a seu modo e alcançam algumas vezes a realidade e outras vezes uma imitação e uma imagem da realidade, poderia alguém suportar tal paradoxo de nosso discurso? Porém, estamos em família e não corremos perigo de adular-nos a nós mesmos. É verdade que, de pronto, nós contemplamos no momento presente, enquanto nos entretemos? E certo que nós contemplamos, como todos aqueles que se divertem; divertimo-nos porque desejamos contemplar; e tanto as crianças quanto os adultos, brinquem ou estejam sérios, parecem não ter outro fim que a contemplação. Todas as ações tendem à contemplação: sejam as ações necessárias, que dirigem principalmente nossa contemplação em direção às coisas exteriores, sejam as ações voluntárias (livres), que as dirigem menos em direção ao exterior, não tendo outro móvel que a contemplação.
Porém, de tudo isto trataremos depois. Falemos agora da terra, das árvores e das plantas. Digamos qual seja sua contemplação e como podemos reduzir as coisas produzidas pela terra e saídas dela à sua atividade contemplativa; como a natureza, que se diz carecer de fantasia e de razão, possui em si contemplação e o que faz o produz pela contemplação que (segundo alguns dizem) ela não possui. (Plotino, citado por Quiles, 1981, pp. 65-66)
A produção de uma dissertação de mestrado constitui um percurso árduo e curioso. No início da escrita de meu trabalho não tinha a menor idéia de como ele terminaria, suas idas e vindas, os modos e maneiras como o texto se fazia, seus excessos, os momentos de secura, o intenso desejo de escrever, e também sua ausência. Há uma alegria de segundo plano que corre pela dissertação. Uma alegria estranha, um puro sofrimento a convocar distintas maneiras de expressão.
Em um mesmo plano de composição, tornou-se possível produzir aproximações de campos distintos, através de uma abordagem paratática, no circuito clínica/literatura/pensamento. Distante ficou a imagem idealizada de uma dissertação de mestrado nos moldes de um academicismo restrito, improdutivo, pouco alegre. Ao fim da viagem, o trabalho apresentado à banca em maio de 2005, intitulado Cartografias da Alegria na Clínica e na Literatura, fez-se de uma maneira insólita e inédita. Fez-se como um exercício de criação, uma linha de fuga, um exercício de aprendizagem em devir.
Um segundo plano salta dos fragmentos clínicos e dos contos literários narrados ao longo do texto, um segundo plano que aos poucos foi se apagando, para ficar o registro escrito, capítulos, páginas, parágrafos, linhas. De memória evoco um verso do poeta Murilo Mendes a dizer: Como são fundamentais / Estes sofrimentos de segundo plano! (Mendes, 1994, p. 543). Penso que poderia brincar com o poeta, dizer de outra maneira, como são fundamentais estas alegrias de segundo plano!
História, Memória e Esquecimento, por Bruno Vasconcelos
Não querer justiça, mas o esquecimento, supondo que tal frase tenha sido dita desta maneira, nos empurra para uma bela confusão. Misto de truculência com ignorância, o general que adorava cavalos também afirmou, e cito de memória, que o brasileiro não sabe, ou não sabia usar o mictório. Curiosamente o pedido tem sido atendido. Apesar de inúmeras teses, dissertações, livros e relatos, a lembrança ou o conhecimento da história recente do país não são generalizados na população e permanecem restritos aos envolvidos e à uma pequena parcela de brasileiros.
Atrelados até o pescoço à lógica de um capitalismo que renova o consumo a cada instante, temos uma juventude que desconhece a história de seus pais. Entre historiadores encontramos a constatação de uma memória seletiva oriunda das dinâmicas das relações de poder na cena social do contemporâneo. Alguns grupos que chegaram ao comando, compostos majoritariamente daqueles que estiveram no exílio, predominaram sobre outros de quê pouco se fala, e apenas o silêncio a recobrir a dor de seus próximos. [cont.]
sexta-feira, 30 de julho de 2010
Isso que me olha, por Valter A. Rodrigues
Um
Um homem procura uma mulher pelas estepes siberianas, recusando todas as recomendações de seu amigo quanto ao risco de sua empreitada. Sim, a mulher é casada, sim, tem uma filha, sim, sim, o marido é ciumento, esse encontro que ele busca, que o obceca, pode matá-lo. Mas não há apelo à razão que possa deslocá-lo de seu movimento e sua fissura. É preciso, é urgente falar com ela. Sua aflição o arrasta, carrega o que quer que encontre em seu caminho, as dores, as ânsias, os olhos, ah, sim, todos os olhos que buscam capturá-lo, pará-lo por um instante que seja, reconhecê-lo no que o move.
Seu movimento, que ignora qualquer barreira, encontra outros movimentos, outras ânsias, outras perambulações. Movimentos que entretanto não lhe dão continência. A mulher, um ponto vermelho na paisagem dourada, um ponto que o ignora e que ele busca, está lá, não exatamente à espera, mas visível sob a luz intensa que a faz emergir única, singular, como pólo irresistível de atração. O que os separa, uma brecha, uma fissura no terreno, marcando o lugar de onde ele fala, interpela, demanda, e o da mulher e a filha que ela chama, sustentando-se numa quase indiferença que o incita, que o provoca. Um corpo que existe à sua revelia, embora só tenha existência porque, de seu lugar, de seu desejo, ele o olha e o interpela. E esta é a questão que ele lança, insistente: estivemos juntos numa festa, lembra-se?, e você me olhou. E agora, o que fazer com isso? O que fazer disso, desse acontecimento singular, desse encontro de olhares? O que fazer dessa captura? A pergunta ansiosa do homem encontra a plácida resposta da mulher que ao mesmo tempo o evita e o atrai: não sei...
A escola descobre o cinema. Essa descoberta assume várias formas. A mais comum e prosaica é o uso do cinema como dispositivo temático. Exibe-se um filme como suporte para algo que se pretende apresentar aos alunos. São abundantes hoje as indicações de filmes para se trabalhar isto ou aquilo a partir de seu conteúdo. Trabalha-se, assim, saúde, história, geografia, ecologia, ética, relações humanas com o recurso aos exemplos. Este é um uso moral do cinema, pois ele supõe sempre a existência de um modelo, de uma referência pré-dada em relação ao qual algum ajuste se propõe, tendo como resultado esperado e final uma compreensão do tema proposto. O filme como narrativa, como texto, está em segundo plano ou nem sequer é considerado.
Três
Todos os filmes são histórias de amor, diz Wim Wenders em O estado das coisas. E a relação primeira com o cinema é de paixão. O encontro com a tela e suas imagens dificilmente é significável senão como encantamento. Não responde às necessidades básicas da vida, não é essencial à sobrevivência, pode ser considerado dispensável ao cotidiano dos homens... Entretanto, encontrá-la, ser tocado por suas imagens, por esse tempo que dura, pelo movimento em transformação que apresenta nos coloca na condição do homem que busca a mulher nas estepes siberianas: você me olhou, e agora, o que fazer com isso? O que fazer com essa perturbação do corpo, com essa desordem sensório-motora, com essa abundância de perceptos e de afectos que o afetam? E não se trata, nessa pergunta, de compreender nem de explicar, mas sim de saber como dispor-se ao encontro com seus ritmos, suas velocidades, suas variedades, seus fluxos, pois é na afetação que se produz nesse encontro que o corpo, tomado por essas forças que lhe chegam sem que delas tenha controle, é forçado a pensar. Um pensar que só é possível no próprio afetar-se, no habitar a diferença que se produz nesse encontro corpo-imagens. Pois a força de um filme não está na tela nem no olho de quem o vê; está no entre.
Zero
quinta-feira, 8 de julho de 2010
Trecho do aforismo 354 de A gaia ciência, de Nietzsche
Adaptado de NIETZSCHE, F. W. A gaia ciência. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.
quarta-feira, 12 de maio de 2010
Curso de Extensão 2010 - Os Sentidos da Clínica
VAGAS PARA O PERÍODO DA MANHÃ JÁ PREENCHIDAS. INSCRIÇÕES ABERTAS PARA NOVA TURMA, AOS SÁBADOS, DAS 14 ÀS 17H. INÍCIO EM 29.05
OS SENTIDOS DA CLÍNICA
Fazer a clínica - Valter A. Rodrigues
1. Teoria da multiplicidade e filosofia da diferença x monolitismo da redução cientificista
2. Criação x interpretação
3. Ética e estética na clínica
4. Fazer com o outro
- o entre no lugar do ente
- a dimensão ético-afetiva no fazer a clínica
- a dimensão ético-política da clínica que se faz
Questões psicopatológicas - Antonio Moura
1. Conceito de psicopatologia
- destaque para século XIX até os nossos dias
2. Psiquiatria e psicopatologia
- operação de “descolar” uma da outra
3. Semióticas da clínica
- criação de regimes de signos
4. O que é uma terapêutica?
- impasses atuais: o que “fazer” com o paciente?
O encontro como possibilidade de acesso ao mundo do outro e de compreensão de si, do outro e da realidade – Daniel Marinho Drummond
1. O encontro significativo e a subjetividade como possibilidades de compreensão do outro, de si e da realidade
2. Atitudes que facilitam um encontro significativo
3. Prática: utilização do método fenomenológico na identificação de eixos de significado e de conexões de sentido presentes no mundo do outro
4. O movimento diante do encontro: afetar e afetar-se
A filosofia da diferença na clínica - Leonardo Maia
1. Freud e Nietzsche
2. A recepção de Freud na filosofia
3. A psicanálise e a filosofia da diferença
4. O sentido da clínica e as alternativas à clínica psicanalítica
5. Clínica e crítica: arte, literatura e pensamento em Deleuze e Guattari
Antonio Moura é psiquiatra, mestre em Educação pela UFF/RJ. Atua na clínica psicodramática e na prática do sociodrama com grupos institucionais. / Daniel Marinho Drummond é psicólogo, mestre em Psicologia pela UFMG. Atualmente é professor substituto na UFBA e na UESB, professor da FJT e psicólogo clínico, atuando em consultório particular. / Leonardo Maia é doutor em filosofia pela PUC-Rio e professor adjunto da área de Filosofia da UESB, onde leciona desde 1999. É editor responsável do APRENDER – Caderno de Filosofia e Psicologia da Educação. As áreas de atuação concentram-se atualmente em Filosofia francesa moderna e contemporânea e Filosofia da Educação. / Valter A. Rodrigues é psicólogo pela PUC-SP, mestre em Comunicação pela Faculdade Cásper Líbero, professor da FJT; atua como psicólogo clínico em consultório particular e como psicólogo concursado na Rede de Atenção e Defesa da Criança e do Adolescente, da PMVC. Coordenador do coletivo Usina - estudos e praticas micropolíticas.
Carga horária total: 90 h - 30 encontros de 3 h, aos sábados.
Custo: 1 (inscrição) + 5 de R$ 150,00
Início: 22 de maio
Desconto de 10% no pagamento a vista.
Local de inscrição: Rua Leonidio Oliveira, 450 A - Recreio
45020-341 – Vitória da Conquista (BA)
Das 9 às 12 h e das 14 às 18 h, com Tamires.
(para inscrição pela internet, veja instruções na Ficha de Inscrição, disponível para download abaixo)
Informações: [077] 3421-9550 / [077]8817-5456 / [077]9136-6808
Clique aqui para download da Ficha de Inscrição
segunda-feira, 29 de março de 2010
Pequena nota sobre o ensino e outras práticas relacionais
Uma história de Jha
Jha, personagem bem conhecido das histórias marroquinas, foi, numa sexta-feira, à mesquita. Nesse dia, os fiéis pressionaram-no a tomar a palavra e dirigir-se a eles. Depois de haver tentado longamente subtrair-se à expectativa deles, Jha acabou por perguntar-lhes: “Vocês sabem o que vou lhes contar?” A platéia respondeu negativamente, e ele lhes disse: “Como posso falar-lhes daquilo que ignoram?”
Na sexta-feira seguinte, os fiéis haviam combinado o que responderiam se Jha tentasse novamente evitar dirigir-se a eles. Depois que ele lhes perguntou novamente: “Vocês sabem o que vou lhes dizer?”, eles retrucaram em coro: “Sim, nós o sabemos”. Jha replicou: “Mas então, de que lhes serve dizê-lo?”, e foi sentar-se tranqüilamente na platéia.
Na terceira sexta-feira, a assembléia acreditou ter enfim encontrado a réplica que forçaria Jha a falar. À questão reiterada: “Vocês sabem o que vou lhes dizer?”, metade da audiência respondeu “Não” e a outra metade respondeu “Sim”. Jha lhes disse então: “Que aqueles que sabem digam àqueles que não sabem...”
[in: Mony Elkaim, Se você me ama, não me ame; abordagem sistêmica em psicoterapia familiar e conjugal. Campinas: Papirus, 1990.]