segunda-feira, 29 de março de 2010

Pequena nota sobre o ensino e outras práticas relacionais

Uma história de Jha

Jha, personagem bem conhecido das histórias marroquinas, foi, numa sexta-feira, à mesquita. Nesse dia, os fiéis pressionaram-no a tomar a palavra e dirigir-se a eles. Depois de haver tentado longamente subtrair-se à expectativa deles, Jha acabou por perguntar-lhes: “Vocês sabem o que vou lhes contar?” A platéia respondeu negativamente, e ele lhes disse: “Como posso falar-lhes daquilo que ignoram?”

Na sexta-feira seguinte, os fiéis haviam combinado o que responderiam se Jha tentasse novamente evitar dirigir-se a eles. Depois que ele lhes perguntou novamente: “Vocês sabem o que vou lhes dizer?”, eles retrucaram em coro: “Sim, nós o sabemos”. Jha replicou: “Mas então, de que lhes serve dizê-lo?”, e foi sentar-se tranqüilamente na platéia.

Na terceira sexta-feira, a assembléia acreditou ter enfim encontrado a réplica que forçaria Jha a falar. À questão reiterada: “Vocês sabem o que vou lhes dizer?”, metade da audiência respondeu “Não” e a outra metade respondeu “Sim”. Jha lhes disse então: “Que aqueles que sabem digam àqueles que não sabem...”

[in: Mony Elkaim, Se você me ama, não me ame; abordagem sistêmica em psicoterapia familiar e conjugal. Campinas: Papirus, 1990.]

4 comentários:

ANARCADEMIA disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Ó que beleza, esse Jha, esse Elkaim!

Cheguei hoje ao blog por vias tortuosas (fazia um tempo que não frequentava, aí vi, num outro site, link pra cá e me toquei... aquém de bem e mal técnico, nosso bloguito precisa manter o pique!).

Como estou num dia de boas leituras (acabo de me alegrar muito com a entrevista de Bento Prado Jr. falando sobre Clastres, uma delícia: http://www.scielo.br/pdf/ra/v46n2/a11v46n2.pdf), vim pro Usina insistir nesse caminho de sempre, pensar com alegria!

Abraço encontreiro, Valter!
Eder

Valter A. Rodrigues disse...

Esse velho Jha sempre me acode quando desanimo em meu fazer ao me deparar com a passividade dos que querem respostas sem se disporem a se haver com suas questões. Ou, pior, quando nem sequer se perguntam por suas questões...

Anônimo disse...

Bons ventos o saúdam, Prof. Valter!
Os signos lingüísticos viciam-nos. Estamos intoxicados com aquilo que as palavras restringem. A socialização forçou-nos a diminuir nosso pensamento para ser apreendido pelo outro. Cada vez mais as migalhas vão sendo dissipadas nos pratos vazios dos homens do futuro. Estar em silêncio é um luxo nessa sociedade de homens verborrágicos.

Rovilson Ribeiro, viajante.