Uma história de Jha
Jha, personagem bem conhecido das histórias marroquinas, foi, numa sexta-feira, à mesquita. Nesse dia, os fiéis pressionaram-no a tomar a palavra e dirigir-se a eles. Depois de haver tentado longamente subtrair-se à expectativa deles, Jha acabou por perguntar-lhes: “Vocês sabem o que vou lhes contar?” A platéia respondeu negativamente, e ele lhes disse: “Como posso falar-lhes daquilo que ignoram?”
Na sexta-feira seguinte, os fiéis haviam combinado o que responderiam se Jha tentasse novamente evitar dirigir-se a eles. Depois que ele lhes perguntou novamente: “Vocês sabem o que vou lhes dizer?”, eles retrucaram em coro: “Sim, nós o sabemos”. Jha replicou: “Mas então, de que lhes serve dizê-lo?”, e foi sentar-se tranqüilamente na platéia.
Na terceira sexta-feira, a assembléia acreditou ter enfim encontrado a réplica que forçaria Jha a falar. À questão reiterada: “Vocês sabem o que vou lhes dizer?”, metade da audiência respondeu “Não” e a outra metade respondeu “Sim”. Jha lhes disse então: “Que aqueles que sabem digam àqueles que não sabem...”
[in: Mony Elkaim, Se você me ama, não me ame; abordagem sistêmica em psicoterapia familiar e conjugal. Campinas: Papirus, 1990.]
4 comentários:
Ó que beleza, esse Jha, esse Elkaim!
Cheguei hoje ao blog por vias tortuosas (fazia um tempo que não frequentava, aí vi, num outro site, link pra cá e me toquei... aquém de bem e mal técnico, nosso bloguito precisa manter o pique!).
Como estou num dia de boas leituras (acabo de me alegrar muito com a entrevista de Bento Prado Jr. falando sobre Clastres, uma delícia: http://www.scielo.br/pdf/ra/v46n2/a11v46n2.pdf), vim pro Usina insistir nesse caminho de sempre, pensar com alegria!
Abraço encontreiro, Valter!
Eder
Esse velho Jha sempre me acode quando desanimo em meu fazer ao me deparar com a passividade dos que querem respostas sem se disporem a se haver com suas questões. Ou, pior, quando nem sequer se perguntam por suas questões...
Bons ventos o saúdam, Prof. Valter!
Os signos lingüísticos viciam-nos. Estamos intoxicados com aquilo que as palavras restringem. A socialização forçou-nos a diminuir nosso pensamento para ser apreendido pelo outro. Cada vez mais as migalhas vão sendo dissipadas nos pratos vazios dos homens do futuro. Estar em silêncio é um luxo nessa sociedade de homens verborrágicos.
Rovilson Ribeiro, viajante.
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